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Polícia Civil abre inquérito para investigar morte de imigrante após passar mal em Aeroporto de SP

Publicada em 06/09/24 às 17:03h - 10 visualizações

por TV Africa Biso Brasil


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 (Foto: Arquivo Pessoal)
Evans Osei Wusu, de 39 anos, fazia parte do grupo que estava retido no aeroporto, em Guarulhos, à espera de refúgio. Ele morreu em decorrência de uma infecção generalizada e enfrentou dificuldades para conseguir auxílio. Comissão Mista Permanente para Migrações Internacionais e Refugiados enviou ofício ao Ministério da Justiça pedindo explicações.

A Polícia Civil instaurou inquérito nesta sexta-feira (6) para investigar a morte do imigrante Evans Osei Wusu, de 39 anos, que morreu após passar mal enquanto estava retido no Aeroporto Internacional de São Paulo, em Guarulhos, à espera de refúgio.

A investigação será feita pela Delegacia de Atendimento ao Turista (Deatur), informou a Secretaria da Segurança Pública.

"O caso inicialmente havia sido registrado como não-criminal, mas diante de novos fatos, a unidade reabriu as investigações. 

Diligências estão em andamento para recolher e analisar imagens de câmeras de segurança e promover a oitiva de testemunhas e partes do inquérito. A unidade segue à disposição da família ou de seu representante legal para a formalização dos trâmites legais", diz a nota.

Mais cedo, o g1 havia informado que o caso estava sendo tratado como jogo de empurra entre as autoridades responsáveis pela entrada de imigrantes no país. Diante disso, a Defensoria Pública da União (DPU) abriu procedimento interno para apurar, e passou a acompanhar a família.

Nesta sexta (6), a Comissão Mista Permanente sobre Migrações Internacionais e Refugiados do Congresso Nacional enviou um ofício ao Ministério da Justiça pedindo informações sobre as circunstâncias da morte do imigrante.

O documento foi assinado pela senadora Mara Gabrilli, pelo deputado Túlio Gadelha e pelo senador Paulo Paim.

O Ministério Público Federal também abriu nesta sexta-feira (6) uma notícia de fato sobre a morte. Em 30 dias, o órgão decidirá se será instaurada investigação ou se será arquivada.

O g1 mostrou o caso de Evans na última quarta-feira (4).

A família relatou que descobriu que o corpo do ganês estava sepultado no cemitério municipal de Guarulhos sem concentimento e, por isso, pede justiça. Os parentes também disseram que ele chegou a pedir ajuda e enfrentou dificuldade para receber auxílio (leia relato da prima mais abaixo).

Inicialmente, a Prefeitura de Guarulhos disse à reportagem que não tinha informações sobre o caso. Já na segunda nota enviada ao g1, a gestão municipal informou que "atuou somente como contratada para realizar o sepultamento do sr. Evans Osei Wusu pelo Hospital Geral de Guarulhos, que é estadual".

"Diante do estado de deterioração do corpo e da falta de retorno da família à respectiva embaixada, providenciou toda a documentação para o enterro, por sua vez liberado pelo IML, também sob responsabilidade do governo estadual", afirmou o texto.

Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública disse que "não cabia à Senajus [Secretaria Nacional de Justiça] o atendimento ou o acompanhamento da assistência ao migrante de Gana" e que "a Senajus não foi comunicada sobre a situação do viajante" (veja, abaixo, a íntegra da nota).

A Secretaria da Saúde estadual informou, também em nota, que "o Hospital Geral de Guarulhos, após constatar o óbito, comunicou às autoridades competentes, incluindo o Consulado e a Embaixada de Gana, para que a família do paciente fosse devidamente informada sobre o falecimento e orientada quanto aos procedimentos para o sepultamento".

"No entanto, diante da ausência de resposta após 16 dias e com o corpo apresentando sinais de deterioração, o serviço funerário municipal foi acionado, e os procedimentos necessários para garantir um enterro digno ao paciente foram adotados."

A Secretaria da Segurança Pública do estado de São Paulo disse apenas, em primeira nota: "um estrangeiro de 39 anos morreu na noite de terça-feira (13/8) após ser socorrido ao Hospital Geral de Guarulhos. O caso foi registrado no 3º DP da cidade como não criminal".

Contudo, o g1 foi informado nesta sexta-feira (6) que a Delegacia de Atendimento ao Turista (Deatur) abriu investigação para apurar o caso.

Já a Polícia Federal afirmou que "o fato ocorreu quando ele ainda estava sob responsabilidade da companhia aérea, em razão do impedimento por ausência de visto para entrar no Brasil".

"E ainda que o óbito tivesse ocorrido em área restrita, a Polícia Civil possui credencial para apurar ocorrências neste local. desta feita, não há nada que atraia a atuação da União, para o fato, o que seria diferente se tivesse ocorrido a bordo de uma aeronave. Adicionalmente o óbito em decorrência de problema cardíaco, já afasta qualquer atuação criminal", diz a PF.

Diante da resposta, a reportagem entrou em contato com a companhia aérea Latam, que disse que "lamenta profundamente o ocorrido e se solidariza com os familiares do passageiro Evans Osei Wusu".

"A companhia acompanhou o atendimento médico prestado ao passageiro pelo Hospital Geral de Guarulhos, e realizou o contato com as autoridades de Gana e do Brasil após a confirmação do óbito. No aeroporto de Guarulhos, a LATAM está oferecendo assistência aos passageiros que embarcaram em seus voos e solicitaram refúgio no Brasil. Em paralelo, a companhia tem dialogado com as autoridades brasileiras no aguardo de uma definição para esta situação", finaliza a nota.

A reportagem questionou a data que foi prestada assistência a Evans, mas a companhia não informou.

A GRU Airport, concessionária que administra o Aeroporto Internacional de São Paulo em Guarulhos, questionada se iria abrir apuração sobre as circustâncias que se deram a morte de Evans disse, em nota, "que os passageiros que aguardam o processo de admissão no país pela Polícia Federal ficam sob os cuidados das Companhias Aéreas até a sua conclusão".

Informou ainda, que, "no dia 11/08, a equipe de atendimento a urgências/emergências do Aeroporto, ao ser acionada, imediatamente providenciou atendimento e encaminhamento do passageiro ao Hospital Geral de Guarulhos".

Daniel Perseguim, jornalista e pesquisador do Fórum Fronteiras Cruzadas (USP), acompanha o caso com a família de Evans e autoridades. Nesta terça-feira (4), houve uma reunião sobre o caso na Assembleia Legislativa do Estado de SP (Alesp) com um representante do Ministério dos Direitos Humanos.

"Estamos tentando entender o que houve e dar uma reposta para a família. Como sociedade precisamos ter uma resposta", disse Perseguim.

"Nós precisamos de justiça para o Evans. Isso é muito triste e nós, como a família dele, não vamos aceitar. Precisamos de justiça e compensação", diz a prima de Evans, Priscilla Osei Wusu.

Ao g1, uma prima de Evans, Priscilla Osei Wusu, explicou que ele chegou ao aeroporto em 4 de agosto, depois de ter sido deportado do México em 2 de agosto. Segundo ela, Evans havia embarcado em Gana e deveria fazer uma cirurgia na coluna em território mexicano.

"Não sei o motivo de ele não ter conseguido entrar no México. Até o médico que deveria operá-lo conversou com a imigração e pediu que o acompanhassem ao hospital. Nós até pagamos o hotel dele naquela noite. [Evans] Voltou para São Paulo e ficou retido após pedir refúgio para ir a um hospital. Ele queria que as autoridades [brasileiras] o mandassem [de volta] para lá", disse Priscilla.

A rota original previa que, após a cirurgia, Evans deveria pegar um voo que fizesse conexões no Brasil e no Catar antes de, finalmente, retornar a Gana. Mas, ao chegar a Guarulhos, ele decidiu tentar entrar em território brasileiro para ser encaminhado a um hospital daqui. Segundo a família, Evans disse que não teria condições de saúde para retornar ao seu país sem ser atendido.

Priscilla relata que, na segunda semana de agosto, ainda retido no terminal de Guarulhos, o primo passou a encaminhar mensagens a um tio informando que estava com muita dor e precisava ir ao hospital urgentemente. Ele afirmou também que só foi atendido após outros imigrantes terem se manifestado para que houvesse algum auxílio.

O g1 teve acesso a essas mensagens (veja abaixo). Em um áudio, Evans reclamou que estava sentindo uma dor no peito e que não entendiam o que ele estava falando.

"Preciso urgentemente de sua ajuda. Estou com uma dor insuportável na coluna, viajei de Gana para o México para fazer uma cirurgia, mas infelizmente não fui internado, não sei o motivo. Estou humildemente solicitando uma cirurgia urgente na coluna aqui no Brasil, tenho dinheiro para pagar. Não posso viajar com segurança de volta para Gana por causa da minha condição", afirmou ele.

E complementou: "Paguei por uma passagem de classe executiva de Gana para o México porque a econômica não era segura para mim. Meu retorno é em classe econômica porque sei que estarei forte e saudável após a cirurgia. Minha situação agora não me permitiria voar com segurança na econômica para Gana e minha dor está ficando insuportável. Por favor, me ajude a marcar uma consulta aqui no Brasil para minha cirurgia na coluna. Obrigado. É isso que devo apresentar a eles".

A certidão de óbito de Evans, à qual o g1 teve acesso, aponta que o ganense morreu de infecção generalizada, após um quadro inicial de infecção urinária. Como endereço, aparece apenas "Aeroporto de Guarulhos". Evans foi enterrado no Cemitério Necrópole do Campo Santo, que é municipal.

Conforme o Ministério da Justiça e Segurança Pública, a morte do imigrante foi registrada em 13 de agosto no Hospital Geral de Guarulhos. No entanto, a família alega que enterraram o corpo sem que fossem avisados.

"Como o hospital pode ter enterrado meu primo sem o consentimento da família? Como puderam fazer isso? Para nós, isso não é algo trivial. Nós temos que prestar uma homenagem aos mortos, é algo muito importante e sério em nossa cultura", diz Priscilla.

"Em 2015, foi assinado um o Termo de Cooperação Técnico-Institucional para Proteção e Promoção de Soluções Humanitárias e Solidárias em Situações de Migrantes Inadmitidos no Aeroporto Internacional de Guarulhos. Participam desse grupo de trabalho o Ministério Público Federal, por meio da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC); Ministério da Justiça e Segurança Pública, por meio da Secretaria Nacional de Justiça (SNJ); Defensoria Pública da União (DPU); Município de Guarulhos, por meio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Assistência Social e de seu Posto Avançado de Atendimento Humanizado ao Migrante (Posto); e o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados.

Em 14 de fevereiro de 2023, foi assinado um termo aditivo (em anexo) prorrogando a cooperação entre esses órgãos. No plano de trabalho (também em anexo), estão definidas as competências de cada instituição. De acordo com o documento, o Departamento de Migrações e a Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, “possui a atribuição, dentre outras, de processar pedidos que concernem nacionalidade e naturalização, entrada e permanência e determinação do status de refugiado”.

“Deve, ainda, fornecer programas de treinamento e organizar cursos, workshops e seminários sobre o atendimento de refugiados, apátridas e vítimas de tráfico de pessoas com o objetivo de aprimorar a atuação do próprio órgão e de empresas que realizam atividades no aeroporto de Guarulhos.”

Ainda de acordo com o plano de trabalho, a Secretaria Nacional de Justiça “tem por atribuição conduzir procedimentos de determinação do status de refugiado e decidir acerca do cancelamento ou perda, em primeira instância, da condição de refugiado;

fornecer diretrizes e coordenar as ações necessárias para a eficiência da proteção e assistência a solicitantes de refúgio e refugiados; aprovar regulamentações que esclareçam a aplicação da Lei 9.474/1997”.

No caso específico, portanto, não cabia à Senajus o atendimento ou o acompanhamento da assistência ao migrante de Gana. A Senajus não foi comunicada sobre a situação do viajante.

A comunicação à Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério da Justiça e Segurança Pública, aconteceu no dia 16 de agosto, após o falecimento do migrante de Gana.

Segundo as informações repassadas ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, o migrante foi atendido pelo posto médico do Aeroporto de Guarulhos, por problemas de saúde, no dia 11 de agosto de 2024. Na mesma data, ele foi transferido ao Hospital Geral de Guarulhos —onde faleceu no dia 13.

Imediatamente, o Ministério da Justiça e Segurança Pública enviou ofício ao Ministério das Relações Exteriores solicitando que providências fossem tomadas para a comunicação da situação à Embaixada de Gana —o que, de fato, foi feito pelo Itamaraty.

Importante registrar que o episódio não tem relação com os novos procedimentos adotados pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública no Aeroporto Internacional de Guarulhos. As medidas foram implementadas a partir do dia 26 de agosto para, justamente, evitar episódios como o do migrante de Gana".

A Defensoria Pública da União (DPU) protocolou em 16 de agosto um documento com uma série de recomendações após constatar violação de direitos humanos na área onde estão centenas de imigrantes retidos à espera de refúgio.

O documento foi encaminhado para Polícia Federal, Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), governo de São Paulo e Prefeitura de Guarulhos após representantes encontrarem imigrantes dormindo no chão, sem agasalhos, além de uma crescente demanda por atendimento de saúde.

"Nós encontramos pessoas com sintomas gripais, pessoas reclamando de outros problemas de saúde. Muito frio, porque muitas delas estão sem cobertor. É inverno em São Paulo. Aeroporto é um lugar frio, sem acesso a alimentação adequada, sem acesso a remédios, com dificuldades de fazer suas higienes diárias, banho, escovar dente. Então, há uma situação massiva de violação aos direitos fundamentais daquelas pessoas ali", afirmou o defensor público Ed William Fuloni à TV Globo.

Após documento protocolado pela DPU, uma reunião convocada pelo Ministério Público Federal para analisar o caso foi realizada na semana passada.

A Defensoria pediu que fosse criada uma sala de situação que monitore o fluxo de entrada e saída do país em tempo real. No encontro, também ficaram definidos os seguintes pontos:

A GRU Airport se comprometeu a buscar modos para assegurar condições, com as companhias aéreas, de garantir acesso à higiene básica e alimentação de todos os migrantes retidos, em medidas que serão acompanhadas pela Defensoria Pública da União e pelo Ministério Público Federal.
O Ministério da Justiça se comprometeu a encaminhar reforço de servidores para atendimento emergencial, tanto nos trabalhos de processamento dos protocolos de refúgio quanto para a segurança no local.
Participaram da reunião representantes de Polícia Federal, Ministério Público Federal, Ministério da Justiça, concessionária GRU Airport, Prefeitura de Guarulhos, Estado de São Paulo, senadora Mara Gabrilli (PSD) e gabinete do deputado Federal Túlio Gadelha (Rede).

Segundo o procurador Guilherme Gopfert, foram chamados vários setores estratégicos que lidam com essa temática para tratar de medidas emergenciais.

"A gente sabe que não é um problema do aeroporto de Guarulhos, é um problema do Brasil, é um problema do estado brasileiro como um todo e, claro, que o estado tem que estar unido nessa hora pra poder enfrentar mais uma vez", afirmou o procurador Guilherme Gopfert antes do encontro.

"Não devemos deixar normalizar essa situação. Que essa situação de crise humanitária não se perpetue. Esse é o nosso grande receio como Ministério Público Federal, que isso seja muito esporádico e não deixar que vire um novo normal", ressaltou.

Em junho deste ano, o Jornal Nacional mostrou que um grupo que quase 300 imigrantes aguardavam a autorização para entrar no Brasil, sendo a maioria homem e da Índia.

Contudo, o número aumentou, conforme a Polícia Federal. Até o começo do mês de agosto eram 466 pessoas retidas esperando entrar no país, segundo a Polícia Federal. Somente em agosto foram 765 solicitações - média de 40 solicitações por dia.

A Polícia Federal informou, em nota, que desde o mês de julho vem sendo observado crescimento no fluxo de viajantes que chegam em trânsito internacional, mas que deixam de seguir viagem, não podendo ingressar no Brasil por falta de visto.

Com isso, segundo a PF, terminam por solicitar refúgio visando entrar no Brasil ainda que sem a documentação pertinente.

"Cumpre destacar que de janeiro a julho a Polícia Federal recebeu um total de 5428 solicitações de refúgio, com média diária de 25 solicitações de refúgio recebidas. Contudo, somente no mês agosto já foram 765 solicitações (média diária de 40 solicitações), sendo 261 nos últimos três dias", afirmou o órgão.

Ainda conforme a PF, o órgão está "buscando otimizar processos e atuar em parceria com outras instituições visando maior celeridade e observância dos direitos humanos dos viajantes".

Em nota, a Prefeitura de Guarulhos disse que o Posto Avançado de Atendimento Humanizado ao Migrante, equipamento municipal instalado no aeroporto, não foi notificado oficialmente sobre a situação, uma vez que essas pessoas estão na área de inadmitidos, de responsabilidade da Polícia Federal.

Já o governo estadual afirmou que acompanha a questão dos refugiados no aeroporto de GRU, que a pasta não foi demandada em relação a oferta de abrigo e está à disposição da Agência da ONU para Refugiados.



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